sexta-feira, 31 de outubro de 2014

LEITE...... PODE OU NÃO PODE?

A moda é ser radical! Corta glúten, corta carboidratos, corta gordura, corta lactose … mas será que isso é necessário?
Quanto ao leite, vale destacar que somos ...os únicos mamíferos que insistimos em nos alimentar de laticínios na fase adulta, pior ainda, leite de outros animais! O problema é que o leite possui um carboidrato chamado lactose, e sua digestão se dá por uma enzima específica, a lactase. Caso haja deficiência na produção dessa enzima (como seria normal após o desmame) haverá intolerância, que se reflete principalmente em desconfortos gastrointestinais. E isso pode ocorrer em qualquer momento da vida, como nos casos de pessoas que não tinham nenhum problema com leite e, de repente, passam a manifestar intolerância (como aconteceu comigo!).
No entanto, cortar laticínios não é tarefa fácil, pois o leite e seus derivados fazem parte da nossa cultura e dos nossos hábitos, e se tornaram uma importante fonte de nutrientes. Além disso, muita gente gosta deles! Enfim, a pergunta que ouço bastante é: devo evitar o leite? E a resposta é: depende!
Em um estudo recente, pesquisadores australianos compararam os efeitos de refeições com ou sem laticínios no conforto gástrico e desempenho de ciclistas. Para garantir que as comparações envolviam a origem dos alimentos, as refeições continham as mesmas quantidades de nutrientes e calorias. Os resultados revelaram que as refeições com laticínios não promoveram desconfortos antes, durante ou após o exercício e nem atrapalharam o desempenho em um teste de 90 minutos que chegava à exaustão.
Devemos ter cuidado com a diminuição indiscriminada na ingestão de laticínios, pois isso pode reduzir fontes de nutrientes importantes, como proteínas e cálcio. Enfim, não estou defendendo e nem condenando o leite. Mas estou dizendo para não seguir gurus e nem dietas da moda, pois isso pode te privar de alimentos importantes à toa. Caso decida cortar os laticínios, converse com seu nutricionista para reequilibrar sua dieta!
Tudo bem que aparecerão os jovens que puxam para o outro extremo e dirão que a melhor bebida para o atleta, que vai te deixar forte, rápido, alto e bonito! Mas não é nada disso, o leite é apenas um alimento que tem seus benefícios e suas limitações. Cabe ao nutricionista orientar adequadamente quanto à sua utilização.
(Paulo Gentil)
Haakonssen EC, Ross ML, Cato LE, Nana A, Knight EJ, Jenkins DG, Martin DT, Burke LM. Dairy-based preexercise meal does not affect gut comfort or time-trial performance in female cyclists. Int J Sport Nutr Exerc Metab. 2014 Oct;24(5):553-8. doi: 10.1123/ijsnem.2014-0069. Epub 2014 Jul 14.

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

SENTIMENTOS X EFICIENCIA

Pegando gancho do texto sobre de uma postagem no Instagram sobre abdutora/adutora, vamos falar dos sentimentos que dominam o planejamento de muitos treinos. Fal...a-se muito em "sentir", "pegar", "queimar" e nada de Biomecânica, Fisiologia, Anatomia... Deve ser porque os livros sobre o tema são muito chatos! Têm muitas letrinhas e nada de fotos de jovens seminus...
Em uma visão geral, as sensações são induzidas pela estimulação de receptores periféricos que convergem para o tálamo e depois para o córtex central. Agora a maluquice: podemos sentir algo que nem ao menos existe, como no caso dos amputados que sentem dores em membros removidos! Sensações ilusórias também ocorrem na musculação.
Vocês podem pegar como exemplo um stiff. Durante esse exercício, é comum se reclamar de dores nas mãos ou nas costas, e raramente sentimos os posteriores “queimando”… mas no outro dia estamos andando igual um pato! Outro exemplo é o leg press, por mais que se sinta mais a coxa na hora do exercício, há estudos mostrando que o glúteo hipertrofia tanto, ou mais, que o quadríceps (Popov et al., 2006). Temos também o caso da cadeira extensora, onde sentimos uma queimação forte nos vastos, mas há estudos indicando que o músculo que mais hipertrofia é o reto femoral (Narici et al., 1996). Por último, análises de dinâmica inversa colocam o trabalho da panturrilha acima do quadríceps durante o agachamento (Bryanton et al., 2012)!? Pois é, a gente não sente… mas acontece.
Então cuidado com o que sente ou com quem se baseia nos sentimentos, pois você pode estar sendo enganado! Não sou um cara insensível, por favor! Só acho que está na hora de parar de brincar com "sentimentos" e começar a usar um pouco de Ciência na hora de elaborar os treinos! Afinal, o coração às vezes se engana… ou vai dizer que você nunca se apaixonou pela pessoa errada!?
(Paulo Gentil)
Bryanton MA, Kennedy MD, Carey JP, Chiu LZ. Effect of squat depth and barbell load on relative muscular effort in squatting. J Strength Cond Res. 2012 Oct;26(10):2820-8.
Narici MV, Hoppeler H, Kayser B, Landoni L, Claassen H, Gavardi C, Conti M, Cerretelli P. Human quadriceps cross-sectional area, torque and neural activation during 6 months strength training. Acta Physiol Scand. 1996 Jun;157(2):175-86.
Popov DV, Tsvirkun DV, Netreba AI, Tarasova OS, Prostova AB, Larina IM, Borovik AS, Vinogradova OL. [Hormonal adaptation determines the increase in muscle mass and strength during low-intensity strength training without relaxation]. Fiziol Cheloveka. 2006 Sep-Oct;32(5):121-7.

terça-feira, 21 de outubro de 2014

EXERCICIOS ALTERNADOS VALEM A PENA?

Exercícios alternados… valem a pena?
Vejo muita gente fazendo bíceps alternado, dando passadas na esteira, alternando as pernas no afundo e etc. Eu sempre alert...o para ineficiência do procedimento, mas hoje serei mais claro!
Em um estudo clássico, Schott, McCully e Rutherford compararam os efeitos de ações musculares longas e curtas nos ganhos de força e massa muscular na perna de homens jovens. Para evitar os efeitos da individualidade, eles usaram um treino diferente para cada perna da mesma pessoa. Uma perna permanecia contraída por 30” e a outra realizava 10 contrações de 3” com 2” de descanso. Ou seja, era sempre 30”, mas feitos de maneira contínua ou intermitente. Ao final, os ganhos de força a perna que fez a contração contínua foi de 54,7%, enquanto a contração alternada promoveu ganhos menores, de 31,5%. Mais interessante ainda foram os ganhos de massa muscular, que ficaram na casa dos 10% para as contrações contínuas e não atingiram significância no lado que descansava entre as contrações.
As análises agudas mostraram que esses resultados podem estar associados ao estresse metabólico, conforme falo em meu livro. De fato, estudos posteriores de Takada mostram que os ganhos de força e massa muscular tem correlação com a acidose que se consegue induzir nos treinos de musculação.
Aí está o problema desses exercícios alternados. Quando um lado está trabalhando, outro está descansando. Isso vale também para aqueles fanfarrões que adoram descansar entre uma repetição e outra, dando seus gemidos e gritinhos. Em treinos metabólicos, procurem manter o músculo trabalhando continuamente, evitando pausa e pontos em que o músculo decansa! Nos tensionais, dá para ser um pouco mais permissivo, mas sem exageros, né?!
Agora, eu pergunto, se descansar 2” entre as ações já trouxe todo esse prejuízo no estudo citado, o que dirá de uma passa na esteira em que se passa 3” contraindo o músculo e aproximadamente 8” descansando???
(Paulo Gentil)
Gentil P. Bases científicas do treinamento de hipertrofia. 5 edição. Create Space, 2014
Schott J, McCully K, Rutherford OM. The role of metabolites in strength training. II. Short versus long isometric contractions. Eur J Appl Physiol Occup Physiol. 1995;71(4):337-41.
Takada S, Okita K, Suga T, Omokawa M, Kadoguchi T, Sato T, Takahashi M, Yokota T, Hirabayashi K, Morita N, Horiuchi M, Kinugawa S, Tsutsui H. Low-intensity exercise can increase muscle mass and strength proportionally to enhanced metabolic stress under ischemic conditions. J Appl Physiol (1985). 2012 Jul;113(2):199-205

terça-feira, 14 de outubro de 2014

PROTEINAS X TREINO

Pesquisadores dinamarqueses dividiram homens jovens em dois grupos: um recebeu 19,5g de whey hidrolisado+19,5g de carboidratos e outro 39g de carboidratos. Dura...nte 12 semanas, os participantes faziam ações excêntricas (apenas a descida) com uma perna e concêntricas (subida) com a outra. Ao final, o ganho de massa muscular para quem tomou whey foi de 8,3 e 6,3% com o treino excêntrico e concêntrico, respectivamente. Para quem não tomou, os ganhos foram menores: 2,7 e 4%.
Os tarados da coqueteleira usariam o estudo para defender o whey. Mas seria ou inocência ou malícia, já que, como não houve controle alimentar, é provável que a dieta de quem recebeu carboidatos estivesse deficiente em proteínas (um viés comum nos estudos que, como esse, foram financiados pelos vendedores de whey).
Entretanto, o estudo traz informações interessantes para olhares mais astutos. Repare que as diferenças entre o treino excêntrico (8,3 vs 2,7%) foram maiores que entre o concêntrico (6,3 vs 4%). Tendo em vista que as ações excêntricas geram mais microlesões e pensando nas diferentes formas de induzir hipertrofia descritas no meu livro, surge uma informação preciosa de como ajustar a dieta de acordo com o tipo de treino. Esses dados sugerem que, para melhorar seus resultados, pode ser necessário aumentar a ingestão proteica durante os treinos tensionais, devido à grande demanda de recuperação tecidual, e pode até haver redução na ingestão de carboidratos, já que eles não são tão usados nesses métodos. Mas é importante falar que o aumento na ingestão proteica não precisa vir de suplementos, pois já está comprovado que isso não traz vantagem em relação à comida.
Mais uma vez fica clara a importância de treino e alimentação andarem lado a lado, reforçando a união que deve haver entre Educação Física e Nutrição!Agora, alguém consegue me explicar como que, diante de tanta complexidade, ainda tem gente seguindo dicas de qualquer Zé Mané?!
(Paulo Gentil)
Farup J, Rahbek SK, Vendelbo MH, Matzon A, Hindhede J, Bejder A, Ringgard S, Vissing K. Whey protein hydrolysate augments tendon and muscle hypertrophy independent of resistance exercise contraction mode. Scand J Med Sci Sports. 2014 Oct;24(5):788-98.
Gentil P. Bases científicas do treinamento de hipertrofia. 5 edição. Charleston: CreateSpace, 2014